domingo, 17 de janeiro de 2010


Chorando pelo Haiti e por nossas tragédias domésticas – reflexões a partir de Lucas 13.1-9

de Solano Portela

As lembranças das inundações de 2008, em Santa Catarina, ainda estavam bem presentes conosco, quando testemunhamos as mortes e prejuízos resultantes de deslizamentos, desmoronamentos e alagamentos nesta transição 2009/2010, em nosso Brasil. Depois, nos últimos dias, estamos sendo impactados com o terremoto no Haiti. Temos testemunhado e chorado com o conseqüente sofrimento chocante, intenso e extremamente abrangente, que nos remete ao Tsunami de 26.12.2004, no Oceano Índico, quando pereceram cerca de 220 mil pessoas.

Não sabemos ainda a extensão da tragédia causada pelo terremoto no Haiti. Alguns falam em 200 mil mortos, sem contar aqueles que ainda enfrentarão as doenças e conseqüências da falta de higiene, alimentos e cuidados médicos. A desagregação de famílias e daquela sociedade, já tão fragmentada pela miséria e ausência de governo, corta o nosso coração. Enquanto vemos as cenas de dor e tristeza, e avaliamos tudo isso, procurando aferir o que podemos e devemos fazer, somos levados às Escrituras para procurar alguma compreensão trazida pelo próprio Deus, para esses desastres.

Acima de tudo, devemos resistir à tentação de procurar respostas que diminuem a bíblica soberania e majestade de Deus, e consequentemente a sua pessoa. Tais “explicações”, “conclusões” e “construções” aparentam ser plausíveis, mas revelam-se meramente humanas, pois contrariam a revelação das Escrituras. Esse tipo de resposta sempre aparece, quando ocorrem tais acontecimentos; elas não são novidade nem têm surgido apenas em nossos dias.


Por exemplo, em novembro de 1755 a cidade de Lisboa foi praticamente arrasada por um grande terremoto. A conclusão emitida por padres jesuítas foi a de que: “Deus julgou e condenou Lisboa, como outrora fizera com Sodoma”. Voltaire (François Marie Arouet), que era um deísta, escreveu em 1756 “Poemas sobre o desastre em Lisboa”. Ali, ele culpa a natureza e a chama de malévola, deixando no ar questionamentos sobre a benevolência de Deus. Jean Jacques Rousseau, respondeu com “Carta sobre a providência”. Nela ele culpa “o homem” como responsável pela tragédia. Ele aponta que, em Lisboa, existiam “20 mil casas de seis ou sete andares” e que o homem “deveria ter construído elas menores e mais dispersas”. Ou seja, procurando “inocentar a Deus e a natureza” ele coloca a agência da tragédia no desatino dos homens.[1]



Sobre o terremoto no Haiti, à semelhança do que ocorreu no Tsunami, vi alguns depoimentos de pastores, falando sobre a “mão pesada de Deus, em julgamento”; opinião semelhante à emitida quando do acidente com o avião que transportava o grupo “Mamonas Assassinas”, em 1996.


Ainda outros, procuram uma teologia estranha às Escrituras, para “isolar” Deus da regência da história. São os mesmos que, quando da ocorrência do Tsunami e do acidente ocorrido com o Vôo 447 da Air France em junho de 2009, emitiram a seguinte conclusão: “Diante de uma tragédia dessa magnitude, precisamos repensar alguns conceitos teológicos” (veja as excelentes reflexões sobre esse último desastre, no post do Augustus Nicodemus, neste mesmo blog: http://tempora-mores.blogspot.com/2009/06/carta-bonfim-deus-e-as-tragedias.html ). No entanto, em vez de formularmos nossa teologia pelas experiências, voltemo-nos ao ensinamento do próprio Jesus.


Em Lucas 13.1-9 temos instrução pertinente sobre vários tipos de tragédias. A primeira tragédia tratada é aquela gerada por homens (Vs 1-3). Certos galileus haviam sido mortos por soldados de Pilatos. A Bíblia diz que “alguns” colocaram-se como críticos e juízes (a resposta de Jesus infere isso); deduziram que aqueles que haviam sofrido violência humana, sangue derramado por armas (em paralelo às situações que vivemos nos nossos dias) seriam mais pecadores do que os demais. O ensino ministrado é o seguinte: Não vamos nos colocar no lugar de Deus. Não vamos nos concentrar em um possível juízo ou julgamento sobre as vítimas. Jesus, em essência diz: cuidem de si mesmos! Constatem os seus pecados! Arrependam-se!


Mas ele nos traz, também, um segundo tipo de tragédias. Esta que é referida é semelhante, guardadas as proporções, à ocorrida no Haiti. São tragédias geradas por “fatalidades”. Ele fala da Torre de Siloé. O texto (Vs 4-5) diz que ela desabou, deixando 18 mortos. Jesus sabia que mesmo quando, aos nossos olhos, mortes ocorrem como conseqüência de acidentes, isso não impede que rapidamente exerçamos julgamento; não impede que tentemos nos colocar no lugar de Deus. E Jesus pergunta: “Acham que eram mais culpados do que todos os demais habitantes da cidade”? O ensino é idêntico: Não se coloquem no lugar de Deus; não se concentrem em um possível juízo ou julgamento sobre as vítimas; cuidem de si mesmos! Constatem a sua culpa! Arrependam-se!


O surpreendente é que Jesus passa a ilustrar o seu ensino com uma parábola (Vs.6-9). Ele fala de uma figueira sem fruto. Aparentemente, a parábola não teria relação com as observações prévias, mas, na realidade, tem. Ela nos ensina que vivemos todos em “tempo emprestado” pela misericórdia divina.


• Figueiras existem para dar frutos - o homem vinha procurar frutos - essa era sua expectativa natural. Todos nós fomos criados para reconhecer a Deus e dar frutos. Esse é o nosso propósito original.

• Figueiras sem frutos “ocupam inutilmente a terra”. O corte é iminente, e justificado a qualquer momento.

• O escape: É feito um apelo para que se espere um pouco mais, na esperança de que, bem cuidada e adubada, a figueira venha a dar fruto e escape do corte.• Lições para o vizinho? Jesus não apresenta a figueira como um paralelo para comparação com outras pessoas – cujas existências foram ceifadas como vítimas de violência ou fatalidades. Ele quer que nos concentremos em nós mesmos, em nossas próprias vidas, pecados e na necessidade de arrependimento.

• Tempo emprestado: O que ele está ensinando e ilustrando, aqui, é que nós, você e eu, como os habitantes do Haiti, vivemos em tempo emprestado; vivemos pela misericórdia de Deus; vivemos com o propósito de frutificar, de agradar o nosso proprietário e criador.

Creio que a conclusão desse ensino, é que, conscientes da soberania de Deus e de que ele sabe o que deve ser feito, não devemos insistir em procurar grandes explicações para as tragédias e fatalidades. Jesus nos ensina que teremos aflições neste mundo (João 1.33) - essa é a norma de uma criação que geme na expectativa da redenção. 1 Pe 4.19 fala dos que sofrem segundo a vontade de Deus. Lemos que não devemos ousar penetrar nos propósitos insondáveis de Deus; não devemos “estranhar” até o “fogo ardente” (1 Pe 4.12).


Assim, as tragédias, desde as locais pessoais até as gigantescas, de características nacionais e internacionais, são lembretes da nossa fragilidade; de que a nossa vida é como vapor; de que devemos nos arrepender dos nossos pecados; de que devemos viver para dar frutos.


Também, não cometamos o erro de diminuir a pessoa de Deus, indicando que ele está ausente, isolado, impotente. Como tantas vezes já dissemos, “Deus continua no controle”. Lembremos-nos de Tiago 4.12: “um só é legislador e juiz - aquele que pode salvar e fazer perecer”. Não sigamos, portanto, nossas “intuições”, no nosso exame dos acontecimentos, mas a Palavra de Deus. Como nos instrui 1 Pe 4.11: “ se alguém falar, fale segundo os oráculos de Deus”.


“Se alguém tiver recursos materiais e, vendo seu irmão em necessidade, não se compadecer dele, como pode permanecer nele o amor de Deus? Filhinhos, não amemos de palavra nem de boca, mas em ação e em verdade” ( 1 João 3.17-18).

Solano Portela

As imagens transmitidas do Haiti parecem cenas de Inferno de Dante. A escala de calamidade é sem precedentes. Em muitos sentidos, o Haiti quase deixou de existir.

O terremoto que mudará para sempre esta nação aconteceu quando placas subterrâneas moveram-se aproximadamente seis milhas abaixo da superfície da terra, ao longo de uma falha geológica que ameaça causar problemas há séculos. Mas ninguém viu um terremoto desta magnitude vindo. O tremor escala 7.0 chegou como um pesadelo, com a cidade de Porto Príncipe destruída, vilas inteiras entrando em colapso, corpos voando pelo ar e sendo esmagados sob montanhas de destroços. Orfanatos, igrejas, mercados, casas, e prédios governamentais, todos destruídos. O governo civil deixou virtualmente de funcionar. Sem energia, as comunicações foram cortadas e os esforços de resgate estão seriamente limitados. Corpos são empilhados, a esperança desaparece e a ajuda, embora a caminho, não chegará a tempo para muitas vítimas.

Mesmo enquanto os pés estão finalmente pisando o solo e os esforços de resgate chegam à ilha, as estimativas de vítimas preveem algo tão alto quanto 500 mil. Dados o terreno montanhoso e as vilas densamente populosas que se localizavam ao longo da falha, vilas inteiras podem ter desaparecido.
A nação mais pobre do Hemisfério Ocidental experimenta uma catástrofe que parece quase apocalíptica.

Na verdade, não é difícil descrever o terremoto como um desastre de proporções bíblicas. Certamente, é como se a ira de Deus tivesse descido sobre a nação caribenha. Adicione a isso o fato do Haiti ser bem conhecido por sua história de sincretismo religioso – misturando elementos de várias crenças, incluindo práticas ocultas. A nação é conhecida pelo vodu, feitiçaria e uma tradição católica que foi imensamente influenciada pelo ocultismo.

A história do Haiti é um catálogo de desastres políticos, um após o outro. Em um relato da luta da nação por independência dos franceses, no século XVIII, é dito que representantes da nação fizeram um pacto com o Diabo para expulsar os colonizadores. De acordo com esse relato, os haitianos consideravam os franceses católicos, e queriam juntar forças com quem quer que se opusesse a eles. Assim, alguns usam essa tradição para explicar tudo que tem marcado a tragédia da história do Haiti – inclusive, agora, o terremoto de 12 de janeiro de 2010.

Deus odeia o Haiti? Essa é a conclusão a que muitos chegam, que aponta o terremoto como um sinal do julgamento direto e observável de Deus.

Deus certamente julga as nações – todas elas – e Deus julgará as nações. Seu julgamento é perfeito e sua justiça é certa. Ele reina sobre todas as nações e sua vontade soberana é demonstrada na ascensão e queda de nações, impérios e pessoas. Toda molécula de matéria obedece a suas ordens, e os terremotos revelam seu domínio – assim como as ondas de socorro e assistência fluindo para o Haiti nesse instante.

Um cristão fiel não aceitaria a afirmação de que Deus é um espectador desses eventos mundiais. A Bíblia claramente afirma o governo soberano de Deus sobre toda sua criação, todo o tempo. Não temos o direito de afirmar que Deus foi surpreendido pelo terremoto no Haiti, ou aceitar que Deus não poderia tê-lo prevenido de acontecer.

O governo de Deus sobre a criação envolve tanto atos diretos quanto indiretos, mas esse governo é constante. O universo, mesmo depois das consequências da Queda, ainda demonstra o caráter de Deus em todas as suas dimensões, objetos e ocorrências. E mais, não temos o direito de afirmar que sabemos porque um desastre como o terremoto no Haiti aconteceu naquele exato local e momento.

A arrogância da presunção humana é real e um perigo presente. Podemos traçar os efeitos de um motorista bêbado até um acidente de carro, mas não podemos traçar os efeitos de vodu em um terremoto – pelo menos, não tão diretamente. Deus julgará o Haiti por sua escuridão espiritual? É claro. O julgamento de Deus é algo que podemos afirmar que entendemos nesse sentido – agora? Não, não nos foi dado esse conhecimento. O próprio Jesus avisou os discípulos sobre esse tipo de presunção.

Por que nenhum terremoto fez tremer a Alemanha nazista? Por que nenhum tsunami afundou os campos de extermínio do Camboja? Por que o furacão Katrina destruiu muito mais igrejas evangélicas que cassinos? Por que tantos ditadores assassinos vivem até a velhice, enquanto muitos missionários morrem jovens? Deus odeia o Haiti? Deus odeia o pecado, e punirá tanto indivíduos quanto nações pecaminosos. Mas isso significa que cada indivíduo e cada nação serão declarados culpados quando medidos pelo padrão da perfeita justiça de Deus. Deus odeia o pecado, mas se Deus simplesmente odiasse o Haiti, não haveriam missionários lá; não haveriam fundos de ajuda para a nação; não haveriam esforços de resgate – não haveria esperança.

O terremoto no Haiti, como todo outro desastre terreno, nos lembra de que a Criação geme sob o peso do pecado e do julgamento de Deus. Isso é verdade para cada célula de nossos corpos, assim como para a crosta terrestre em cada ponto do globo. O universo inteiro espera a revelação da glória do Senhor vindouro.

A Criação clama pela esperança da Nova Criação. Em outras palavras, o terremoto nos lembra de que o Evangelho de Jesus Cristo é a única mensagem de esperança real. A cruz de Cristo declara que Jesus ama o Haiti – e o povo haitiano é objeto de seu amor. Cristo teria mostrado à nação haitiana seu amor, e compartilhado seu Evangelho. Em meio a essa tragédia inefável, Cristo nos teria animado a ajudar o povo sofredor do Haiti, e a correr para falar ao povo do Haiti sobre seu amor, sua cruz, e a salvação em seu nome somente.

Tudo sobre a tragédia no Haiti aponta para nossa necessidade de redenção. Essa tragédia pode levar a uma nova abertura ao Evangelho entre o povo haitiano. Isto será para a glória de Deus. Enquanto isso, o povo de Cristo deve fazer o que for possível para aliviar o sofrimento, tratar os feridos, e confortar os enlutados. Se o povo de Cristo é chamado para fazer isso, como podemos dizer que Deus odeia o Haiti?

Se você tem alguma dúvida sobre isso, pegue sua Bíblia e abra em João 3.16. Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Essa é a mensagem de Deus para o Haiti
Extraido.
Publicada por Bispo Ronilto William Rodrigues em Sábado, Janeiro 16, 2010